Difference between revisions of ".Mjky.MjU1Ng"

From DigitalMaine Transcription Project
Jump to: navigation, search
 
(2 intermediate revisions by the same user not shown)
Line 8: Line 8:
 
— declarou-nos Ben Porter, fisico e poeta
 
— declarou-nos Ben Porter, fisico e poeta
  
HAVIA- NOS chegadod a noticia de que Bern Porter, americano que exibe no seu cartao de visita os titulos de fisico assistente, poeta, editor dos seus proprios livros e presidente do Instituto de Pensamento Avancado, estava, de visita fugas, em Lisboa.  E logo a nossa reportagem o procurou e descobriu a verdadeira identidade do poeta-cientista, autor de um livro intitulado «Founds» (coisas achadas), que sera publicado em Portugal ainda este ano, e tambem de um ensaio; «Deixei Um Manifesto e Um Testamento de Ciencia e Arte (Sciart)», cujo apendice contem ideias e notas «indispensaveis para os proximos duzentos anos», segundo afirmacao dele.
+
HAVIA- NOS chegadod a noticia de que Bern Porter, americano que exibe no seu cartao de visita os titulos de fisico assistente, poeta, editor dos seus proprios livros e presidente do Instituto de Pensamento Avancado, estava, de visita fugas, em Lisboa.  E logo a nossa reportagem o procurou e descobriu a verdadeira identidade do poeta-cientista, autor de um livro intitulado «Founds» (coisas achadas), que será publicado em Portugal ainda este ano, e também de um ensaio; «Deixei Um Manifesto e Um Testamento de Ciencia e Arte (Sciart)», cujo apendice contém ideias e notas «indispensáveis para os proximos duzentos anos», segundo afirmacao dele.
  
E um homem grisalho, de pequena estatura e sobre o forte, a rondar os 50 anos, este fastcinante cientista que ama a poesia, ou este poeta que nao pode deixar de incluir a ciencia nos sues trabalhos literarios.  Um topico de realce no mundo de hoje, em que, aparentemente, se cava cada vez mais o fosso entre as artes e as ciencias.  Bern Porter fecha os olhos quando fala, curva ligeiramente a cabeca e cobre a cara com as maos.  Vive cada palavra que diz, parece isolar-se do que o rodeia quando pensa.  O vocabulo é um mundo rico e misterioso, um poco para onde o poeta mergulha e la descobre tesouros que transporta para a superficie, atraves da sua sensibilidade.
+
E um homem grisalho, de pequena estatura e sobre o forte, a rondar os 50 anos, este fastcinante cientista que ama a poesia, ou este poeta que nao pode deixar de incluir a ciencia nos sues trabalhos literarios.  Um topico de realce no mundo de hoje, em que, aparentemente, se cava cada vez mais o fosso entre as artes e as ciencias.  Bern Porter fecha os olhos quando fala, curva ligeiramente a cabeca e cobre a cara com as maos.  Vive cada palavra que diz, parece isolar-se do que o rodeia quando pensa.  O vocábulo é um mundo rico e misterioso, um poco para onde o poeta mergulha e descobre tesouros que transporta para a superficie, através da sua sensibilidade.
  
[Bold] — Interessa-me (e cultivo) a poesia experimental... e desio-quei-me a este vosso maravilhoso pais porque, como americano, tenho grande respeito e admiracao pela poesia portuguesa... Certos temas tratados por ela, como a tristeza, o sentimentalismo e o destino, atraem-mos sobremaneira... Penso, até, que a poesia americana esta em débito para com a vossa... Voces descobriram o mundo, Portugal é um pais velho e novo simultaneamente, ha que respeitar a tradicao, primeiro, para, em seguida, se voar para e futuro... [end bold]
+
[Bold] — Interessa-me (e cultivo) a poesia experimental... e desio-quei-me a este vosso maravilhoso pais porque, como americano, tenho grande respeito e admiracao pela poesia portuguesa... Certos temas tratados por ela, como a tristeza, o sentimentalismo e o destino, atraem-mos sobremaneira... Penso, até, que a poesia americana está em débito para com a vossa... Voces descobriram o mundo, Portugal é um pais velho e novo simultaneamente, ha que respeitar a tradicao, primeiro, para, em seguida, se voar para e futuro... [end bold]
  
 
— Como define a poesia experimental que cultiva?
 
— Como define a poesia experimental que cultiva?
Line 20: Line 20:
 
Contou-mos que Picasso, um dia, encontrou, por acaso, um selim de bicicleta e, mais tarae, um guiador ainda de bicicleta, juntou ambas as pecas e chamou ao conjunto «a found bull» (um touro achado).  Picasso deve, assim, ser considerado precursor desta nova tecnica literaria.
 
Contou-mos que Picasso, um dia, encontrou, por acaso, um selim de bicicleta e, mais tarae, um guiador ainda de bicicleta, juntou ambas as pecas e chamou ao conjunto «a found bull» (um touro achado).  Picasso deve, assim, ser considerado precursor desta nova tecnica literaria.
  
[Bold] — Os americanos estao a faxer, nesta momento, o mesmo, mas com palavras... penso que seja um passo adiante em relacao ao imagismo de William Carlos Williams, por exemplo... [end bold]
+
[Bold] — Os americanos estao a fa
  
O imagismo é uma corrente poética que teve larga voga nos anos 30 e dai para a frente, e que consta da assuncao de um poema como uma estrutura organica independente, o vocabulo como uma célula, um grupo de palavras como um tecido autonomo, que nada deve a realidade exterior e assenta a sua vida propria na combinacao (metaforica ou imagistica) de vocabulos.  Ezra Pound, William Carlos Williams, sao alguns dos expoentes maximos desse movimento literario.
+
________________________
  
[Bold] — O peota portugues Jorge de Sena, radicado nos Estados-Unidos, tem sido dos que mais me tem influenciado...  E pena que mais poetas vossos nao se desioquem até la e nos ajudem... [end bold]
+
ENTREVISTA DE JOAO ALVES DA COSTA
  
— Mas, especific amente, qual é o tipo de experimentalismo poético a que se dedica?
+
_________________________
  
[Bold] — Na América, agora, ha quantro correntes principais que nos frascinam... sao os «Founds», de que ja falei, os «Dos», os «Dids» e o «Scipoe» ... [end bold]
+
zer, nesta momento, o mesmo, mas com palavras... penso que seja um passo adiante em relacao ao imagismo de William Carlos Williams, por exemplo... [end bold]
  
Perante o mosso ar de interragacao, Bern Porter foi buscar a sua mala de materiais e comecou a explicar:
+
O imagismo é uma corrente poética que teve larga voga nos anos 30 e dai para a frente, e que consta da assuncao de um poema como uma estrutura organica independente, o vocábulo como uma célula, um grupo de palavras como um tecido autonomo, que nada deve a realidade exterior e assenta a sua vida propria na combinacao (metaforica ou imagistica) de vocábulos.  Ezra Pound, William Carlos Williams, sao alguns dos expoentes maximos desse movimento literario.
  
[Bold] — Os «Dos» estao a provocar grande entusiasmo ... na base ha o verbo «to do» (fazer) e abrange as afirmacoes
+
[Bold] — O peota portugues Jorge de Sena, radicado nos Estados-Unidos, tem sido dos que mais me tem influenciado... E pena que mais poetas vossos nao se desioquem até la e nos ajudem... [end bold]
  
 +
— Mas, especific amente, qual é o tipo de experimentalismo poético a que se dedica?
  
 +
[Bold] — Na América, agora, há quantro correntes principais que nos frascinam... sao os «Founds», de que já falei, os «Dos», os «Dids» e o «Scipoe» ... [end bold]
  
 +
Perante o mosso ar de interragacao, Bern Porter foi buscar a sua mala de materiais e comecou a explicar:
  
 +
[Bold] — Os «Dos» estao a provocar grande entusiasmo ... na base ha o verbo «to do» (fazer) e abrange as afirmacoes
  
 +
[Photo of Bern Porter]
 +
Bern Porter [centered under photo]
  
 +
que, de forma representativa, derivam desse verbo... faz-se bem, faz-se mal, fax-se o posivel, sao exemplos ...  A mis-sao do poeta é remeter-se a um arduo trabalho de pesquisa, em jornais, revistas, etc., encontrar combinacoes de vocabulos assim, tem de comecar sempre por um verbo, e de pos recortam-se e colam-se numa folha de papel ... o melhor exemplo que lhe posso dar é a expressao «drink softy» (beba suavemente), que contém uma accae de fazer... Os poetas sempre tiveram um sentimento muito especial em relacao a palavras... Quer ver outros tipo de «Dos»?  (e tirou da pasta uma série de papéis com recortes colados que nos foi mostrando):
  
 +
[Bold] 1) «Try the sit» [end bold] (experimente o assento).
 +
[Bold] 2) «Changez la couleur de vos yeux» [end bold] (mude a cor dos seus olhos.
 +
[Bold] 3) «Concentrate on the chrysanthemus» [end bold] (concentre-se no crisantemo».
 +
[Bold] 4) «Come a long way from basic black» [end bold] (caminhe a partir de um negro basico).
 +
[Bold] — E necessario é que comece por um verbo... — ajuntou. [end bold]
  
 +
Bern Porter mostrou, a seguir, outros exemplos de «Founds»:
 +
[Bold] — Este poema chama-se «Shave» (barbear-se) e segue deste modo:
  
no seu cartaoPorpoeta,
+
No brush [end bold] (nao há pincel)  
fisico assistente,
+
[Bold] no lather [end bold] (nao há espuma de [sabao)
vis ita os titulos
+
[Bold]  no blades [end bold] (nao há laminas)
a
+
[Bold] no blood [end bold] (nao sangue)
 
+
[Bold] no push [end bold] (nao empurre)
editor dos seus pr6prios livros e presidente do Institute de Pensamento Avan<;ado, estava, de visita
+
[Bold] (continua na 11.ª pág.)
fugaz, em Lisboa . E logo a nossa reportagem o procurou e descobriu a verUm poeta
 
dadeira identidade do ra, durante anos . •. milhoes de
 
descobr4! milhoes •
 
poeta-cientista, autor de palavras • acaba por encontrar
 
um livro intitulado um• combina~io arbitraria de«Founds» (coisas acha- las que o excita. Agarra numa
 
""'
 
teso..-a, recorta-as, •
 
das) , que sera publicado dound poem• ( um poema iach•em Portugal ainda este do ).
 
a.no, e tambem de um enContou-nos que Picasso, um
 
saio; «Deixei Um Mani - dia, encontrou, por acaso, i.m
 
festo e Um Testamento de selim de bicicleta e, mais tarCiencia e Arte (Sciart)». cie, um guiador ainda de biciambas as pe<;as e
 
cujo apendice contem cleta, juntouconjunto «a found
 
chamou ao
 
ideias e notas «indispen- bull» (um touro achado). Pisaveis para os pr6ximos casso deve, assim, ser cansldeduzentos anos», segundo rado prE!CI.R'SOf' desta nov.i tecni ca li tef'n.
 
afirmac;ao dele.
 
- Os americano, 11tio a fa•
 
f um homem grisalho, de pequena estatura e sobre o· forte,
 
50 anos, este fas cinante cientista que ama a ooesia. ou este poeta que nio oode
 
deixar de incluir a ciencia nos
 
seus trabalhos literarlos. Um t6pico de realce no mundo de
 
hoie, em que, aparentemente,
 
se cava cada vez mais o fosso
 
entre as artes e as ciencias.
 
Bem POf'ter fecha os olhos quando fala, curva ligeiramente a c•be<;a e cobre a cara com as
 
mios. Vive cada palavra que
 
diz, parece isolar-se do aue o
 
rodeia quando pensa. 0 vocabulo e um mundo rico e misterioso, um poc;o para onde o ooeta mergulha e 16 ~scobre tesouros que transporta para a \U•
 
perficie, atraves da sua sensibilidade.
 
- lnterena-me f• cultivo) a
 
poesia experimental... • desloquei-me a est• vosso maravilh- pail porque, como americano, tenho grande respeito e
 
admi,ac;io pela poesi• portugulu ... Certos tentas tratados por
 
1la, c,omo a tristeu, o sentimen.
 
talismo e o destino, atraem-nos
 
sobremoaneira . . . Penso. ate. qN
 
a poesia americana esta em debito para COM • v - .. . Voch
 
descobrirlffl o 111undo, Portu•
 
g&I e UM pa~ velho • novo 1'1multi..ea,me-nte, ha 111111 ~pei tar a tradic;io, pr<imeiro, para,
 
a rondar os
 
 
 
• - Como define a poesla · experimental oue cultiva?
 
- A poesia experimental 6
 
como um pa1Mio pela praia,
 
onde II descobre uma pedra bonita e, depois, i leva-la par1
 
casa I guarda-la numa pr,tel•I·
 
 
 
te, qua! e o tipo de experlmentalismo poetico a que se
 
dedk:a?
 
- Na America, agora, ha
 
quatro correntes principals que
 
fasciMm .. . sio os «Foun••, de que ja fa lei, 01 «Dos•,
 
os «Dich• 11 o «Scipoe,, . ..
 
Perante o nosso ar de interrog~ao. Bem Porter foi buscat"
 
• sua mala de materiais e come<;ou a explicar:
 
- Os «Dou estio a prove,!llr'ancle etttmiasmo. .. na
 
.,_ ha O verbo «to cto• ( ,._
 
ser) e HNlll&e N ~~oea
 
 
 
exemc,!o que lhe IMISSO dar •
 
a .. .,.._10 «clrittk eoftJ• ( be1,.a ruavemente), que contem
 
um,a acc;ao de fazer ... 01 poetas NIIIPN tlwenm WII leldimen.to lllll'ito especi., - · ,._
 
l~ao • palawn ... Qv• ver-.
 
tros tipo cte «Dosal (e tirou
 
e
 
da pasta uma seri- de papeis
 
com recortes colados que nos
 
foi most1"ando):
 
1) «Try th• lit• (experlmente o assento) .
 
2) «Changes la couleur de
 
( mude a cOf' dos
 
'IFOI yeux•
 
 
 
seus olhos.
 
3 ) «Concentrate on the chryunthe111uH ( concentre-se no
 
crisantemo•.
 
4) .eo- a long way fro•
 
basic blacb ( caminhe a partir
 
de um negro b6slco I •
 
- I necenirio , que comece por um verbo . •• - aluntou.
 
Bern Porter mostrou, • seexemplos de
 
outros
 
lJUlr.
 
«Founds•:
 
- late poema ch•••· M
 
.Sh.... ,.......__.,., .......
 
llestellNNlo:
 
No brusll ( nio hA pince!)
 
......._ (nao hA espuma de
 
Csabio)
 
IIO blNft (nlo hA llmlnas)
 
110 blood ( nlo h6 sangue)
 
empurre I
 
H push ( nio
 
 
 
ENTREVISTA DE
 
 
 
JOAO ALVES
 
DA COSTA
 
ser, neste momento, o -mo,
 
111as com palavras ... penso que
 
reseja um passo adiante la~ao ao im&gisfflo cte William
 
Carlos Williams, por exemplo ...
 
0 imagismo e uma oorrente
 
poetica que teve la,rga voga nos
 
anos 30 e dai para a frente,
 
e que consta da assun<;io de
 
um poema como uma estrutura
 
organica independente, o voc6bulo como uma celula. um grupo de palavras como um tecido aut6n0fno, que nada deve a
 
realidade exterior e assenta •
 
sua vida or6pria na combina~ao (~t&f6rica OU imagisnca)
 
de vocabulos. Ezra Pound, William Carlos Williams, sio alguns dos expoentes maximos
 
de$se movimento liter6rio.
 
- 0 poeta portuguh lorge
 
de Sena, radicado nos Estados-U nidos, tem lido dot qN 111a.e
 
111e tem influenciado ... It pen•
 
qlN 111ai1 poe,ta,s VO.OS nlo N
 
desloquem ate la e nos ajudem ...
 
- Mas, esp e c 1 f i c amen-
 
 
 
pois r ~ -N e colam-te nta folha cte papel . . . o
 
 
 
(COllffzlua
 
 
 
IICI
 
 
 
u.•
 
 
 
pa9J
 
 
 
NOVI DAD ES
 
 
 
LITERARIAS
 
OBRAS DE
 
VITORINO NEMtSIO
 
Um autor clAsslco da llteratura
 
 
 
portuguesa
 
 
 
Bern Porter
 
 
 
ONDAS MtDIAS
 
 
 
..,., cle fomta ,..,,_tativa,
 
tlerivam cte.e verbo ... fas - H
 
bem, fas-se ~ . tas-se o pos1ivel, lio exemplos. . . A M11sio do poeta e remeter-H a
 
- af'diuo ~ a tho . • pesquliontait, revistas. etc.,
 
.... _.,,... combinac;oes cte vocibulos ....,.., tim de come~M
 
sempre por um Vfl'bo, e de-
 
 
 
Medl<ta~c'5es em torno de flgu-
 
 
 
e factos llterAr~
 
 
 
25$00
 
 
 
EXIUDOS
 
Hist6ria sentimental e polltl
 
do ~beralism0 na emiar~lo
 
25$00
 
 
 
0 MISTtRIO DO
 
PACO DO MILHAFRE
 
Cc,ntos
 
 
 
10$00
 
 
 
FESTA REDONDA
 
D6c:lmaa e cantigas de terrelro
 
25$00
 
 
 
I
 
 
 
 

Latest revision as of 18:43, 27 November 2019

DIARIO POPULAR, LISBOA, 24-8-1972

NO MUNDO DA POESIA EXPERIMENTAL AMERICANA

QUALQUER TIPO DE POESIA DEVE PARTIR DA NATUREZA E DA HUMANIDADE...

— declarou-nos Ben Porter, fisico e poeta

HAVIA- NOS chegadod a noticia de que Bern Porter, americano que exibe no seu cartao de visita os titulos de fisico assistente, poeta, editor dos seus proprios livros e presidente do Instituto de Pensamento Avancado, estava, de visita fugas, em Lisboa. E logo a nossa reportagem o procurou e descobriu a verdadeira identidade do poeta-cientista, autor de um livro intitulado «Founds» (coisas achadas), que será publicado em Portugal ainda este ano, e também de um ensaio; «Deixei Um Manifesto e Um Testamento de Ciencia e Arte (Sciart)», cujo apendice contém ideias e notas «indispensáveis para os proximos duzentos anos», segundo afirmacao dele.

E um homem grisalho, de pequena estatura e sobre o forte, a rondar os 50 anos, este fastcinante cientista que ama a poesia, ou este poeta que nao pode deixar de incluir a ciencia nos sues trabalhos literarios. Um topico de realce no mundo de hoje, em que, aparentemente, se cava cada vez mais o fosso entre as artes e as ciencias. Bern Porter fecha os olhos quando fala, curva ligeiramente a cabeca e cobre a cara com as maos. Vive cada palavra que diz, parece isolar-se do que o rodeia quando pensa. O vocábulo é um mundo rico e misterioso, um poco para onde o poeta mergulha e lá descobre tesouros que transporta para a superficie, através da sua sensibilidade.

[Bold] — Interessa-me (e cultivo) a poesia experimental... e desio-quei-me a este vosso maravilhoso pais porque, como americano, tenho grande respeito e admiracao pela poesia portuguesa... Certos temas tratados por ela, como a tristeza, o sentimentalismo e o destino, atraem-mos sobremaneira... Penso, até, que a poesia americana está em débito para com a vossa... Voces descobriram o mundo, Portugal é um pais velho e novo simultaneamente, ha que respeitar a tradicao, primeiro, para, em seguida, se voar para e futuro... [end bold]

— Como define a poesia experimental que cultiva?

[Bold] — A poesia experimental e como um passeio pela praia, onde se descobre uma pedra bonita e, depois, é leva-la para casa e guarda-la numa prateleira, durante anos... Um poeta descobre milhoes e hilhoes de palavras e acaba por encontrar uma combinacao arbitraria delas que o excita. Agarra numa tesoura, recorta-as, e é um «found poem» (um poema achado). [end bold]

Contou-mos que Picasso, um dia, encontrou, por acaso, um selim de bicicleta e, mais tarae, um guiador ainda de bicicleta, juntou ambas as pecas e chamou ao conjunto «a found bull» (um touro achado). Picasso deve, assim, ser considerado precursor desta nova tecnica literaria.

[Bold] — Os americanos estao a fa

________________________

ENTREVISTA DE JOAO ALVES DA COSTA

_________________________

zer, nesta momento, o mesmo, mas com palavras... penso que seja um passo adiante em relacao ao imagismo de William Carlos Williams, por exemplo... [end bold]

O imagismo é uma corrente poética que teve larga voga nos anos 30 e dai para a frente, e que consta da assuncao de um poema como uma estrutura organica independente, o vocábulo como uma célula, um grupo de palavras como um tecido autonomo, que nada deve a realidade exterior e assenta a sua vida propria na combinacao (metaforica ou imagistica) de vocábulos. Ezra Pound, William Carlos Williams, sao alguns dos expoentes maximos desse movimento literario.

[Bold] — O peota portugues Jorge de Sena, radicado nos Estados-Unidos, tem sido dos que mais me tem influenciado... E pena que mais poetas vossos nao se desioquem até la e nos ajudem... [end bold]

— Mas, especific amente, qual é o tipo de experimentalismo poético a que se dedica?

[Bold] — Na América, agora, há quantro correntes principais que nos frascinam... sao os «Founds», de que já falei, os «Dos», os «Dids» e o «Scipoe» ... [end bold]

Perante o mosso ar de interragacao, Bern Porter foi buscar a sua mala de materiais e comecou a explicar:

[Bold] — Os «Dos» estao a provocar grande entusiasmo ... na base ha o verbo «to do» (fazer) e abrange as afirmacoes

[Photo of Bern Porter] Bern Porter [centered under photo]

que, de forma representativa, derivam desse verbo... faz-se bem, faz-se mal, fax-se o posivel, sao exemplos ... A mis-sao do poeta é remeter-se a um arduo trabalho de pesquisa, em jornais, revistas, etc., encontrar combinacoes de vocabulos assim, tem de comecar sempre por um verbo, e de pos recortam-se e colam-se numa folha de papel ... o melhor exemplo que lhe posso dar é a expressao «drink softy» (beba suavemente), que contém uma accae de fazer... Os poetas sempre tiveram um sentimento muito especial em relacao a palavras... Quer ver outros tipo de «Dos»? (e tirou da pasta uma série de papéis com recortes colados que nos foi mostrando):

[Bold] 1) «Try the sit» [end bold] (experimente o assento). [Bold] 2) «Changez la couleur de vos yeux» [end bold] (mude a cor dos seus olhos. [Bold] 3) «Concentrate on the chrysanthemus» [end bold] (concentre-se no crisantemo». [Bold] 4) «Come a long way from basic black» [end bold] (caminhe a partir de um negro basico). [Bold] — E necessario é que comece por um verbo... — ajuntou. [end bold]

Bern Porter mostrou, a seguir, outros exemplos de «Founds»: [Bold] — Este poema chama-se «Shave» (barbear-se) e segue deste modo:

No brush [end bold] (nao há pincel) [Bold] no lather [end bold] (nao há espuma de [sabao) [Bold] no blades [end bold] (nao há laminas) [Bold] no blood [end bold] (nao há sangue) [Bold] no push [end bold] (nao empurre) [Bold] (continua na 11.ª pág.)