.Mjky.MjU1Ng

From DigitalMaine Transcription Project
Revision as of 18:43, 27 November 2019 by Bev D. (talk | contribs)
(diff) ← Older revision | Latest revision (diff) | Newer revision → (diff)
Jump to: navigation, search

DIARIO POPULAR, LISBOA, 24-8-1972

NO MUNDO DA POESIA EXPERIMENTAL AMERICANA

QUALQUER TIPO DE POESIA DEVE PARTIR DA NATUREZA E DA HUMANIDADE...

— declarou-nos Ben Porter, fisico e poeta

HAVIA- NOS chegadod a noticia de que Bern Porter, americano que exibe no seu cartao de visita os titulos de fisico assistente, poeta, editor dos seus proprios livros e presidente do Instituto de Pensamento Avancado, estava, de visita fugas, em Lisboa. E logo a nossa reportagem o procurou e descobriu a verdadeira identidade do poeta-cientista, autor de um livro intitulado «Founds» (coisas achadas), que será publicado em Portugal ainda este ano, e também de um ensaio; «Deixei Um Manifesto e Um Testamento de Ciencia e Arte (Sciart)», cujo apendice contém ideias e notas «indispensáveis para os proximos duzentos anos», segundo afirmacao dele.

E um homem grisalho, de pequena estatura e sobre o forte, a rondar os 50 anos, este fastcinante cientista que ama a poesia, ou este poeta que nao pode deixar de incluir a ciencia nos sues trabalhos literarios. Um topico de realce no mundo de hoje, em que, aparentemente, se cava cada vez mais o fosso entre as artes e as ciencias. Bern Porter fecha os olhos quando fala, curva ligeiramente a cabeca e cobre a cara com as maos. Vive cada palavra que diz, parece isolar-se do que o rodeia quando pensa. O vocábulo é um mundo rico e misterioso, um poco para onde o poeta mergulha e lá descobre tesouros que transporta para a superficie, através da sua sensibilidade.

[Bold] — Interessa-me (e cultivo) a poesia experimental... e desio-quei-me a este vosso maravilhoso pais porque, como americano, tenho grande respeito e admiracao pela poesia portuguesa... Certos temas tratados por ela, como a tristeza, o sentimentalismo e o destino, atraem-mos sobremaneira... Penso, até, que a poesia americana está em débito para com a vossa... Voces descobriram o mundo, Portugal é um pais velho e novo simultaneamente, ha que respeitar a tradicao, primeiro, para, em seguida, se voar para e futuro... [end bold]

— Como define a poesia experimental que cultiva?

[Bold] — A poesia experimental e como um passeio pela praia, onde se descobre uma pedra bonita e, depois, é leva-la para casa e guarda-la numa prateleira, durante anos... Um poeta descobre milhoes e hilhoes de palavras e acaba por encontrar uma combinacao arbitraria delas que o excita. Agarra numa tesoura, recorta-as, e é um «found poem» (um poema achado). [end bold]

Contou-mos que Picasso, um dia, encontrou, por acaso, um selim de bicicleta e, mais tarae, um guiador ainda de bicicleta, juntou ambas as pecas e chamou ao conjunto «a found bull» (um touro achado). Picasso deve, assim, ser considerado precursor desta nova tecnica literaria.

[Bold] — Os americanos estao a fa

________________________

ENTREVISTA DE JOAO ALVES DA COSTA

_________________________

zer, nesta momento, o mesmo, mas com palavras... penso que seja um passo adiante em relacao ao imagismo de William Carlos Williams, por exemplo... [end bold]

O imagismo é uma corrente poética que teve larga voga nos anos 30 e dai para a frente, e que consta da assuncao de um poema como uma estrutura organica independente, o vocábulo como uma célula, um grupo de palavras como um tecido autonomo, que nada deve a realidade exterior e assenta a sua vida propria na combinacao (metaforica ou imagistica) de vocábulos. Ezra Pound, William Carlos Williams, sao alguns dos expoentes maximos desse movimento literario.

[Bold] — O peota portugues Jorge de Sena, radicado nos Estados-Unidos, tem sido dos que mais me tem influenciado... E pena que mais poetas vossos nao se desioquem até la e nos ajudem... [end bold]

— Mas, especific amente, qual é o tipo de experimentalismo poético a que se dedica?

[Bold] — Na América, agora, há quantro correntes principais que nos frascinam... sao os «Founds», de que já falei, os «Dos», os «Dids» e o «Scipoe» ... [end bold]

Perante o mosso ar de interragacao, Bern Porter foi buscar a sua mala de materiais e comecou a explicar:

[Bold] — Os «Dos» estao a provocar grande entusiasmo ... na base ha o verbo «to do» (fazer) e abrange as afirmacoes

[Photo of Bern Porter] Bern Porter [centered under photo]

que, de forma representativa, derivam desse verbo... faz-se bem, faz-se mal, fax-se o posivel, sao exemplos ... A mis-sao do poeta é remeter-se a um arduo trabalho de pesquisa, em jornais, revistas, etc., encontrar combinacoes de vocabulos assim, tem de comecar sempre por um verbo, e de pos recortam-se e colam-se numa folha de papel ... o melhor exemplo que lhe posso dar é a expressao «drink softy» (beba suavemente), que contém uma accae de fazer... Os poetas sempre tiveram um sentimento muito especial em relacao a palavras... Quer ver outros tipo de «Dos»? (e tirou da pasta uma série de papéis com recortes colados que nos foi mostrando):

[Bold] 1) «Try the sit» [end bold] (experimente o assento). [Bold] 2) «Changez la couleur de vos yeux» [end bold] (mude a cor dos seus olhos. [Bold] 3) «Concentrate on the chrysanthemus» [end bold] (concentre-se no crisantemo». [Bold] 4) «Come a long way from basic black» [end bold] (caminhe a partir de um negro basico). [Bold] — E necessario é que comece por um verbo... — ajuntou. [end bold]

Bern Porter mostrou, a seguir, outros exemplos de «Founds»: [Bold] — Este poema chama-se «Shave» (barbear-se) e segue deste modo:

No brush [end bold] (nao há pincel) [Bold] no lather [end bold] (nao há espuma de [sabao) [Bold] no blades [end bold] (nao há laminas) [Bold] no blood [end bold] (nao há sangue) [Bold] no push [end bold] (nao empurre) [Bold] (continua na 11.ª pág.)